Convidamos três poetas para escreverem inspiradas em quadros da artista plástica Paula Siebra.
Aceitaram o convite as poetas Ivana de Lima Fontes, Laís Araruna de Aquino e Pâmela Filipini.
de olhos bem fechados
ivana fontes
ilha, água em beiradas e banzos
assim pretendo guardar-me:
intacta, mas de pés molhados
sentindo pela ponta da língua
o sal reticente cortando o lábio
tontura intocável — distante
dentro das janelas redondas
os navios se conduzem sozinhos
ainda que os comandantes se esforcem
está dado: ser parte da paisagem — intangível
nenhuma tecnologia nos livrará
de sermos o mesmo barco a vela
que atravessou outros mares em 1700:
os mares convocam seus deuses e
jamais têm piedade (que piedade nos salvará?)
ventos, peixes e civilizações — as águas decidirão
sucumbirão a terra (que vive para ser superfície dos pés)
e de face conturbada e móvel*
conseguiremos nos ver refletidos
em sua superfície (em que se afundam nossos pés)
enquanto isso, insisto na tentativa de
todos os dias, a cada manhã em que
uma gota de orvalho espanta a pia,
a cada movimento pendular do oceano:
‘com todo o meu interior, permanecer
de costas’ — feito pedra.
Ivana de Lima Fontes tem sangue de Aracaju e sotaque de Maceió. Já fez música, já fez direito, já fez matéria sobre emagrecimento e só nunca deixou de fazer poesia. É graduanda em jornalismo na Faculdade Cásper Líbero. Conheça também seu trabalho no Medium.
Paula Siebra nasceu em Fortaleza, Ceará. Em 2016, muda-se para o Rio de Janeiro para estudar Pintura na UFRJ. A artista tem como enfoque imagens relacionadas ao cotidiano, à intimidade e ao imaginário nordestino. Começa a expor em 2017, numa coletiva no Museu Nacional de Belas-Artes. Desde então, participa de diversas outras exposições em instituições como Centro Cultural dos Correios e Centro Cultural da Light.Seu trabalho tem origem na exploração de temas já consagrados na Pintura, como retratos, paisagens e naturezas-mortas, que ao longo do tempo vão ganhando um caráter formal peculiar: há uma simplificação no desenho da forma e uma redução no contraste entre os tons cromáticos que estabelecem polarizações entre realidade e sonho, como um devaneio sobre o cotidiano.